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Monday, December 18, 2006

Baixo Minho

O Rio Minho

Entre as referências clássicas que se reportam ao conhecimento mais antigo da costa peninsular e descrição dos acessos de acostagem e penetração para o interior, o rio Minho é um dos que mereceram especial menção.

Constando da lista de nomes de Plínio, em Estrabão é descrita a morfologia da sua embocadura, com uma insula a separar as duas barras, das margens que o confinavam, aspectos nada despicientes para o relacionamento com o comércio mediterrânico que veio a concorrer e a substituir outros relacionamentos norte-atlânticos.

De Bénis muda de nome para Minius, o que de algum modo atrai mais atenção, pela explicação que pede a alteração, a existência de mínio. Discute-se sobre a localização da nascente, o seu percurso, mas dão-se informações precisas sobre acesso, navegabilidade e recursos.

A minuciosa análise de Estrabão do potencial de riqueza económica não especifica, por razões óbvias do interesse romano, o principal recurso. Sal, peixe e derivados, cavalos seriam produtos bem-vindos ao comércio romano. Mas era, sobretudo, a riqueza metalífera o grande motor de colonização, aliada a um povoamento denso capaz de fornecer a mão-de-obra necessária à exploração, com garantida subsistência por recursos alimentares abundantes, de pesca, marisco, caça e produtos agrícolas,

O rio Minho foi na romanização, a estrada do ouro e do estanho. Por alguma razão Plínio é enviado a estas paragens em missão oficial.

Desde Ourense, Las Medulas e Covas são sítios exemplares da presença de materiais estratégicos para manutenção da presença romana.

A listagem das potencialidades mineiras de caciterite e ouro em ambas as margens, até à foz, como se documenta por explorações arqueológicas e reservas actuais, mais que justifica a estratégia de ocupação romana, com índices de profunda romanização indígena, como se deduz da análise da cultura material.

O acesso comercial a estes recursos estratégicos, mesmo a partir do Mediterrâneo, é anterior à romanização. Disso são testemunho materiais de tradição púnica e gregos em Santa Tecla, Coto da Pena, entre outros lugares.

Os indicadores de povoamento do Baixo Minho, pelas razões apontadas, favoráveis a expansão demográfica, permitem-nos determinar diversos níveis de ocupação, estabelecer horizontes culturais que ilustram a sua evolução nesta zona:

O Paleolítico é abundantemente ilustrado por indústria lítica de picos e lascas de quartzito, Asturiense / Ancorense;

Representam o Neolítico estruturas de arquitectura monumental e a memória de muitas outras desaparecidas. O dolmen da Barrosa é o exemplar mais bem conservado.




O início da metalurgia com o horizonte de Atíos /Água Branca denota, além de evolução tecnológica, aspectos de organização e estatuto social denunciados por armas de cobre e esplêndida ourivesaria

Coto da Pena (Vilarelho, Caminha) e Santa Tecla (Pontevedra) documentam no Bronze Final, uma continuidade no relacionamento das duas margens, entre si, com o Norte-atlântico e o mundo mediterrânico, ilustrando a fase IA (A. C. F Silva 1986) nesta área.
Este período de formação notabiliza-se pelo incremento dado à metalurgia. Novas ligas e diferentes tecnologias de fundição que permitem obter lâminas com elasticidade suficiente para aplicação em fíbulas de molas (tipo Alcores e Acebuchal em Coto da Pena). O facto de algumas peças não terem bolhas resultantes de gases da fundição indica que os técnicos metalúrgicos usavam barros porosos na moldagem, o que se confirma pela natureza das coquilhas que têm aparecido em escavação.

A fase IB, seguindo a mesma periodização (A.C.F.Silva 1986), de desenvolvimento tecnológico e de maior relacionamento com o interior e Sul, estaria bem patente no Castro de Torroso. na Galiza.

Alterações políticas e económicas a Sul, depois do sucesso da batalha de Alália (535 a.C.) e 1º tratado Roma/Cartago (509 a.C.) tiveram consequências a Norte, com novos relacionamentos, detectáveis na cultura material do Baixo Minho, por assimilação de novas tecnologias Movimentações dos célticos e túrdulos (Estrabão, 3, 3, 5; Mela, 3, 8; Plínio, 4, 112-113) trazem consigo uma cultura celtizante que deixou marcas nas zonas onde se implantaram, os célticos entre o Lima e a ria de Pontevedra.

Esta nova fase, II A, é bem representada nas estações de Coto da Pena em Vilarelho, Caminha (A. C. F. Silva 1986) e no lado oposto, pelo Castro da Forca e Troña (Hidalgo Cuñarro 1996).

Produtos gregos continuam a chegar através do comércio púnico. Importações itálicas, v.g.pré-campaniense (A. C. F. Silva 1986) no Coto da Pena (Vilarelho) e em Santa Tecla comprovam novos relacionamentos comerciais.
O fim da 2 ª guerra púnica (201 a.C.), prenuncia mudanças que para A. C. F. Silva justificam uma fase IIB.

Mas o acontecimento mais marcante que anuncia o interesse romano pelo Noroeste vem a ser, em 138 a. C., a expedição de D. Júnio Bruto.
Âncora (Caminha), Santa Tecla (Pontevedra), Santa Luzia (Viana do Castelo), entre outros grandes povoados, surgem na intenção de responder, por junção de forças em aglomerados concentrados e organizados espacialmente, a interesses de domínio exógeno, o que implicaria hierarquização dos povoados e ordenamento de estratégico domínio territorial. É o início da fase III, divisível em duas etapas, IIIA e IIIB (A. C. F. Silva 1986) pelas guerras cântabras (27-19 a.C.) e vindo a terminar com a dinastia dos Flávios (69-96 d.C.).
A fase IV, a partir dos Flávios vai até ao estabelecimento dos Suevos em Tuy (411 d.C.).

A ocupação romana, dada a natureza acidentada do território, estabeleceu estratégias de domínio no condicionalismo possível. Os castros continuaram ocupados, novos povoados surgem a menor altitude, castros agrícolas (C. A. B. Almeida 1996), explorando os terrenos aluvionares de boa aptidão agrícola, sem abandonar locais onde a reserva de mão-de-obra era necessária para as tarefas de extracção mineira

Os centros de comando, na romanização, aparecem com mais força na margem direita do Minho, vindo Tuy, situada no cruzamento da via fluvial com a estrada romana, a tomar a hegemonia como cabeça de território que detinha na chegada das invasões germânicas e que conservou até alta Idade Média

Da natureza do domínio romano desde a versão de moderação e entendimento até crueza de trato têm-se feito valer diferentes posições.

A arqueologia dos povoados do Baixo-Minho e a análise da cultura material mostra pacífica evolução: alargamento de casas sem alterar função, reaproveitamento de estruturas, imitação de modelos cerâmicos, utilização de adereços romanos, assimilação de tecnologias. Orósio (Histórias VII, 41) porém, como lembra A. González Blanco (1984, 59-60) na catequese dos cristãos invadidos, faz ressaltar uma sensação de castigo divino aos romanos pelo mau trato das perseguições durante duzentos anos, e até de uma certa boa vontade dos invasores que, a troco de terras e de dinheiro, até deslocavam, se assim o queriam, os indígenas, pacientes e obedientes aos desígnios divinos, para outros lugares mais seguros. A opinião de Orósio não parece estar muito de acordo com a destruição verificada na villa romana de Afife e por um conjunto de entesouramento aí escondido de moedas dos séculos IV/V.

A romanização conduziu à unificação da cultura, da língua, do modo de viver e esbateu as barreiras individualizantes de muitos povos, agremiando-os, segundo as conveniências administrativas de Roma, manu militari. Com a crise da anarquia militar do século III d. C., o poder enfraquecido deixou de ser tão intervencionista; rarearam as ordens vindas de Roma. Houve um certo ressurgimento e progresso cultural, detectável nas estações à beira do Minho; melhores produções cerâmicas, dispersão do povoamento pelas terras agricultáveis.

A imagem da Galécia no século IV, antes das invasões bárbaras era favorável, segundo a descrição da Expositio totius mundi et gentium: “A seguir à Gália vem a Hispânia, terra vasta e grande, rica em homens doutos e em todos os negócios de que mencionamos parte: exporta, suficiente para todo o mundo, azeite, garum, vestuário variado, toucinho, e montadas. (…)
Sobretudo exporta esparto, o melhor da terra pela qualidade, necessário porque salva todo género de barcos”.
O esparto era de facto indispensável ao desenvolvimento da navegação comercial. justificando-se a implementação da sua produção.

A foz do Minho de excelentes condições de aportagem, com recursos mineiros estratégicos, era porto de escoamento e de contactos bem documentados pela arqueologia.

A. Baptista Lopes

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